segunda-feira, setembro 11, 2006

O Déficit na Saúde do Governo Aécio

Adriano Miglio Porto e Daniel Galupo de Paula Penna*

A Emenda Constitucional (EC) nº 29 foi instituída, no ano de 2000, visando garantir um mínimo de recursos a ser aplicado na saúde pública. Estabeleceu como patamar para a manutenção do sistema público estadual de saúde um percentual sobre base de receita formada pelos impostos de competência estadual e pelos recursos dos impostos transferidos pela União, deduzidas as parcelas transferidas aos municípios.

Na adequação dos orçamentos a esta nova ordenação constitucional, se previu uma fase de transição, iniciada em 2001, com o aumento gradual do percentual de aplicação de recursos, até que se alcançasse, em 2004, 12% da base de receita.

No entanto, apesar de beneficiada pela vinculação de recursos, a área de saúde pública foi prejudicada pela interpretação frouxa do governo sobre quais seriam as despesas realmente financiadas por estes recursos.

Embora a Emenda 29 previsse a emissão de Lei Complementar destinada a regulamentá-la, esta ainda não foi elaborada pelo Congresso Nacional.

Segundo reconhece o Conselho Nacional de Saúde (CNS), "a Lei Complementar deverá estabelecer um conceito normativo de ações e serviços públicos de saúde, importante na medida em que definirá precisamente o universo de atividades que tem seu financiamento contabilizado e cujas despesas devem ser acompanhadas, para fins de cumprimento do dispositivo constitucional".

Procurando suprir a lacuna da Lei Complementar, o CNS, usando de suas prerrogativas de ente normativo superior da estrutura do SUS, emitiu a Resolução nº 322, de 08 de maio de 2003 na qual destaca que os principais critérios para a definição do conceito são o de eqüidade e universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de atenção à saúde. Esse parâmetros foram legitimados pela aprovação da maioria das entidades ligadas à saúde pública no país.

Segundo a Resolução 322 do CNS, consideram-se despesas com ações e serviços públicos de saúde aquelas que sejam destinadas às ações e serviços de acesso universal, igualitário e gratuito e de responsabilidade específica do setor de saúde, não se confundindo com despesas relacionadas a outras políticas públicas que atuam sobre determinantes sociais e econômicos, ainda que com reflexos sobre as condições de saúde.

Estabelece ainda que não devem ser consideradas como despesas públicas de saúde pagamento de aposentadorias e pensões; assistência à saúde que não atenda ao princípio da universalidade (clientela fechada); merenda escolar; saneamento básico; limpeza urbana e remoção de resíduos sólidos (lixo) e preservação e correção do meio ambiente.

Em Minas Gerais, a partir de 2003, passou-se a considerar como despesas de saúde várias atividades complementares ao SUS. Ações que, segundo a Lei n° 8.080/90, apenas contam com a colaboração do Sistema, como as políticas de saneamento e de meio ambiente, passaram a entrar, conjuntamente aos órgãos do Sistema Estadual de Saúde Pública, como parte integrante no calculo da aplicação dos recursos vinculados.

Esta nova metodologia de cálculo incluiu praticamente todas as ações cuja exclusão é expressamente recomendada pelo CNS. Entre as despesas computadas pelo Governo, cuja inclusão é vedada pelo Conselho Nacional de Saúde, encontram-se aquelas destinadas ao atendimento de clientelas fechadas, bem como gastos a cargo da Fundação Estadual de Meio Ambiente (FEAM) e da Copasa.

O período de 2003 a 2006 tem sido marcado pelo reiterado desrespeito, por parte do governo de Minas Gerais, da determinação constitucional de vinculação de recursos às ações e serviços públicos de saúde. A inclusão de despesas espúrias entre as ações foi efetuada por meio de manobras de contabilidade criativa e da violação de preceitos legais.

Assim, o governo, apesar da resistência da oposição e dos setores de saúde do Estado, tem se recusado sistematicamente a demonstrar as despesas em saúde de acordo com o modelo aprovado pela Secretaria do Tesouro Nacional e pelo Ministério da Saúde e alterou os critérios de cálculo em frontal desobediência à LDO 2003 e a determinação do Tribunal de Contas do Estado.

Também "interpretou" a Constituição alegando que seria possível incluir despesas custeadas com fontes diferentes das provenientes dos impostos e transferências, desde que em montante equivalente ao definido pela vinculação, o que representou a diminuição de R$1.007.094.118,00 nas contas da saúde só em recursos da Copasa.

Graças a utilização desses expedientes, ao longo dos últimos três anos, as aplicações em saúde têm se mantido mais ou menos constantes, em torno de 6% dos recursos de impostos e transferências livres do Estado, ou cerca de metade a que o setor teria direito.

Desse modo, no período, o setor já acumula no governo Aécio, até 2005, um déficit de R$1.899.171.057,49, aos quais podem se somar uma previsão de quase um bilhão, em 2006. Imagine o que se poderia ter avançado na saúde do público mineiro caso se tivesse priorizado a aplicação desses recursos segundo preceitua o Conselho Nacional de Saúde.

(* Adriano Miglio Porto e Daniel Galupo de Paula Penna são assessores da minoria na ALMG)

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